
Nos primeiros meses de 2015, em meio a reformulações dentro e fora de campo, um dos principais pedidos da torcida do Cruzeiro era um meia de qualidade, o emblemático “camisa 10”, que viesse para ajudar a suprir a saída de Éverton Ribeiro e Ricardo Goulart, referências e símbolos do incontestável bicampeonato brasileiro. Passaram-se dias, semanas e meses, e esse craque tão desejado não apareceu. Irregular e oscilante, o time patinava, e o torcedor sempre apontava tal carência como uma das principais razões. As mudanças continuaram e a equipe foi despencando na tabela, preocupando seus adeptos. A gota d’água veio na noite melancólica de 30 de agosto, quando, se sentindo impotente e à beira do desespero, o torcedor exorcizou seu grito de dor no Mineirão. Mal sabia que, quando o Cruzeiro foi presa fácil para o Santos, as coisas mudariam de rumo e nova ordem seria instaurada.
O desabafo do cruzeirense fez acordar o presidente Gilvan de Pinho Tavares, que, corajosamente, começou a corrigir alguns dos próprios erros. Ouviu o torcedor e trouxe para perto Bruno Vicintin, seu novo braço direito. Agiu rápido e buscou Mano Menezes para apagar o incêndio. E, em meio a outros atos de sabedoria, retribuiu o grito do povo com ações que trouxeram de volta o torcedor ao campo, iniciando ali um espetacular processo de recuperação e sinergia, que recolocou o Cruzeiro nos trilhos. O bruto torcedor estrelado não deixou barato. Comprou a briga, vestiu a camisa e foi para a arquibancada empurrar a equipe para triunfos vitais. O incessante grito de “Zêeero”, antes em tom de desabafo, passou a ecoar como demonstração de força e imponência além do Mineirão. Grito que veio direto da alma para fazer da torcida não o 12º jogador, mas sim o craque e fator de desequilíbrio que faltavam até então.
Se Ribeiro e Goulart foram os protagonistas em 2013 e 2014, não é exagero dizer que o melhor do Cruzeiro em 2015 foi o seu torcedor. Este mesmo que carrega no peito as cinco estrelas e tem nas veias o sangue azul do clube amado. Que, tão bem acostumado a ver e ajudar a conduzir a Raposa ao topo, não se conforma em ver instituição tão grandiosa em situações atípicas. Que, se vir a camisa celeste pendurada no varal durante uma tempestade, não se resume a torcer contra o vento: pega o manto estrelado, o veste e enfrenta a tempestade com sua farda, segunda pele. Sou dos que acreditam que estamos enfrentando constantes provações na vida. O segredo é como lidar e aprender com elas. O Cruzeiro e o cruzeirense tiveram suas provações e amarguras em determinado período deste ano, mas souberam como lidar, aprender e enfrentá-las de frente. Até porque um gigante nunca foge à luta.
Assim como os bravos imigrantes italianos que ajudaram a construir o Time do Povo há quase 100 anos, a Nação Azul carregou o Cruzeiro nos braços em 2015 e se tornou o craque do time, o tal camisa 10 que ela andou pedindo por um tempo. Por isso, a história não mente e jamais vai mudar: o melhor do Cruzeiro é, de fato, o cruzeirense.
* Alisson Guimarães, 31, é publicitário e escreve sobre o Cruzeiro no blog Trem Azul, do ESPN FC. Na próxima semana, será novamente a vez de um atleticano. Mais um espaço para os torcedores mineiros, que já são representados nas colunas fixas do cruzeirense Henrique Portugal, às quartas-feiras; do americano Paulo Vilara, às quintas; e do atleticano Fred Melo Paiva, aos sábados.