Futebol Nacional

MERCADO

O novo eldorado da bola

Com salários milionários bancados por estatais, China vira mercado cada vez mais atraente para jogadores brasileiros. Idioma e gastronomia, porém, são desafios

postado em 18/01/2015 08:43

Shandong Luneng/Divulgacao - Guanghzou Evergrande/Reproducao de internet

Segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos EUA, a China quer se tornar uma potência também no futebol. Para isso, seus clubes têm investido pesado na formação de jogadores e também na contratação de estrangeiros, tendo o Brasil como um de seus principais fornecedores, como provam as recentes contratação de Ricardo Goulart, ex-Cruzeiro, pelo Guangzhou Evergrande, e de Diego Tardelli pelo Shandong Luneng, cujo salário seria em torno de R$ 2 milhões mensais, livres de impostos.

Como a qualidade técnica ainda é baixa se comparada aos principais campeonatos do mundo, além de não haver tantos holofotes sobre os torneios locais, os clubes oferecem remunerações altas e regalias, como casa e carro, para convencer os atletas a se mudarem para a terra de Mao Tsé-Tung. Assim, muitos jogadores, inclusive com potencial para atuar na Europa, acabam aceitando o desafio de ajudar o futebol chinês a crescer, bem pagos por empresas estatais dos mais variados ramos – da construção civil à energia.

“Se você tiver disposição para crescer profissionalmente, para superar adversidades, para ficar longe da família, é uma grande oportunidade. Posso dizer que me sinto feliz aqui”, afirma o armador e atacante Elkeson, de 25 anos, e que está indo para sua terceira temporada pelo Guangzhou Evergrande, pelo qual foi bicampeão da Primeira Divisão, a chamada Chinese Super League, sendo artilheiro em ambos os torneios, e também da Liga dos Campeões da Ásia em 2013.

Revelado pelo Vitória e com passagem pelo Botafogo, ele sofreu em sua chegada à Ásia, principalmente por causa do frio. A língua continua sendo um obstáculo, suplantado pela vontade de vencer. “Temos um tradutor no clube, mas dentro de campo a língua é simples. Atualmente, meus companheiros entendem quando peço a bola, quando elogio e também quando reclamo”, diz o jogador, que vê a modalidade em evolução no país. “Claro que a questão financeira ainda é primordial, mas o futebol está crescendo aqui. Tanto que a Europa tem acompanhado o futebol chinês de perto e até contratado jogadores daqui. O Brasil deveria seguir esse caminho.”

Elkeson ressalta que os treinos são bem parecidos com os do Brasil ou com os da Europa. Para isso, contribui o fato de praticamente toda a comissão técnica de seu clube ser italiana – Marcelo Lippi comandou o time por quase três anos e em dezembro deu lugar ao compatriota Fabio Cannavaro.

“A estrutura é excelente, o clube é muito organizado, você não tem de se preocupar com nada a não ser jogar futebol”, declara o armador, que se sente especialmente motivado ao saber que atuará sempre em estádios cheios. “O público é de 40 mil, 50 mil pessoas por partida.”

SEM PALITO

 

Quem também se diz adaptado à vida na China é o atacante Aloísio, ex-Figueirense e São Paulo. Em pré-temporada com o Shandong Luneng no Brasil, ele também afirma ter superado as dificuldades iniciais e se prepara para a segunda temporada do outro lado do mundo.

“No meu clube dão todo o suporte necessário, até contrataram um cozinheiro para fazer comida parecida com a nossa e nos dão garfo e faca”, declara o jogador, que não se arrisca com os hashi, os palitos orientais, na hora das refeições.

Por essas mordomias, os atletas acreditam ter dado o passo certo ao aceitar a proposta chinesa. “Se algum jogador me perguntar se vale a pena, vou dizer que sim. Você só tem que estar disposto a crescer, a se sacrificar. No caso do Guangzhou, nosso sonho agora é voltar ao Mundial. Tenho certeza de que o Ricardo Goulart vai nos ajudar bastante”, argumenta Elkeson, que ressalta o fato de viver em uma cidade grande, com quase 19 milhões de habitantes, e que oferece a mesma infraestrutura de uma metrópole ocidental. Um banco de estrangeiros

Além de jogadores, a China aposta na importação de treinadores para ajudar o futebol local a atingir excelência. A própria Seleção já esteve sob a liderança de muitos estrangeiros, como o sérvio Bora Milutinovic, comandante na Copa do Mundo de 2002, a única que o país disputou, e atualmente é conduzida pelo francês Alain Perrin. Os clubes também passaram a importar os chamados “misters”.

Cuca, por exemplo, deixou o Atlético logo depois do Campeonato Mundial de Clubes de 2013, seduzido por salário de cerca de R$ 1,5 milhão mensais, livres de impostos, no Shandong Luneng, cujo maior rival nacional é o Guangzhou Evergrande, treinado pelo italiano Fabio Cannavaro. Apesar de se mostrar satisfeito com a decisão, ele revela ter encontrado dificuldades, como incutir nos chineses suas ideias táticas.

“Eles estavam acostumados a jogar com duas linhas de quatro e precisei de uns seis meses para conseguir fazer a equipe se adaptar a atuar com um volante e três armadores, por exemplo”, declara o treinador, que hoje se mostra feliz por ter conseguido fazer os comandados assimilarem suas ordens.

Em entrevista à ESPN Brasil, ele fez questão de frisar que o futebol chinês não é exatamente para quem busca os holofotes no exterior. “Isso é nítido. Não adianta a gente enganar o jogador. O Tardelli vai ter recompensa financeira muito boa, dinheiro bom, livre de imposto. Vai ter responsabilidade em campo, vai ter de jogar bem. Mas a Seleção Brasileira fica mais difícil”, afirma ele. “Não tem um acompanhamento como se tem no Brasil. Jogadores como o Ricardo Goulart têm de pesar bem esse lado para depois não se arrepender. Ele tem de saber bem o que ele quer.”

Como Jinan é uma cidade pequena, ele não encontra tantas facilidades quanto em Guangzhou e Xangai, por exemplo. Sem vida social e morando na concentração do próprio clube, até mesmo ir a um restaurante é complicado, segundo o ex-comandante atleticano.

Força na arquibancada


A chegada de jogadores estrangeiros à China, especialmente brasileiros, torna o Campeonato Chinês um produto mais valioso. Apesar de a média de público ter diminuído em 2014 em relação ao ano anterior, o futebol, quarto esporte mais popular do país – atrás do tênis de mesa, tai-chi-chuan e esportes aquáticos –, levou mais torcedores aos estádios do que o Campeonato Brasileiro na temporada anterior. O país aparece em 10º lugar no ranking das médias de público pelo mundo, com cinco posições de vantagem sobre o Brasil.

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