DA ARQUIBANCADA

Instinto matador

Lugar para errar é no ataque. Nesse ponto, é muito fácil ser atacante. Ele tenta o tempo todo e normalmente ainda fica com o glamour das vitórias

postado em 05/05/2015 12:00 / atualizado em 05/05/2015 08:22

RODRIGO CLEMENTE / EM DA PRESS
No ano passado, o Skank fez dois shows na África do Sul. Tive a oportunidade de fazer um safári e chegar bem perto de leões que vivem de forma selvagem. O bicho é muito folgado. Não faz absolutamente nada e ainda deixa o trabalho da caça para as leoas. É o primeiro a comer quando algum animal é abatido e vive do seu reinado enquanto tiver forças. Mas o mais interessante é o olhar matador de um felino. Ele não tem a mínima compaixão e seu foco para atacar um animal que serve de alimento é brutal. É por isso que recebeu o apelido de rei da selva.

Às vezes, acho que o Cruzeiro administra demais os resultados. O Campeonato Brasileiro tem um formato em que esse tipo de situação é absolutamente aceitável, mas a Libertadores não perdoa essa atitude. Temos pela frente o São Paulo em dois jogos, nos quais esse espírito de ganhador tem de entrar em campo junto com o nosso time. Não existe espaço para erros ou complacência, como ocorreu contra o time do outro lado da lagoa no jogo do Independência. Nele perdemos a chance de uma vitória jogando melhor e com um a mais em campo.

Conversando com meu amigo Mário Martins, ele me lembrou do Zico contando um caso do falecido técnico gaúcho Carlos Froner: “O Froner defendia que, se tiver de matar o jogo, mata mesmo logo. Se for só enfiar a fiaca e tirar, o ‘bandido’ pode dar um tiro. Enfia a faca na barriga do adversário, roda lá dentro e garanta que ele vá morrer”. Essa metáfora era para representar que não se deve ter dó ou recuar para administrar um resultado favorável. Não temos uma defesa maravilhosa para ficar fazendo isso em jogos importantes. Independentemente de sermos atrapalhados por motivos que vão além dos nossos 11 jogadores em campo, não podemos fazer esse tipo de opção.

Um dos meus ídolos de infância era o Morais, zagueiro da conquista da Libertadores de 1976. Com ele, não havia conversa ou toque de bola bonito. Era bom no que fazia e não tinha conversa. Outro ídolo que tenho é o Puyol, ex-Barcelona. Com ele, também não havia conversa nem dancinhas nos gols. Não acredito em zagueiro com excelente toque de bola. O risco de algum erro é muito grande. Quando ele erra, a chance de recuperação é muito pequena. Lugar para errar é no ataque. Nesse ponto, é muito fácil ser atacante. Ele tenta o tempo todo e normalmente ainda fica com o glamour das vitórias. Nem vou escrever sobre a posição dos goleiros, que não têm uma segunda chance para os erros. Como o Felipão já bem disse: “Zagueiro tem de zagueirar”.

O instinto matador de um zagueiro é impedir o gol adversário a qualquer preço, e o do atacante é não perder as chances criadas.

Gostaria que o nosso time fosse um pouco mais audacioso. O excesso de prudência não tem sido boa opção em competições como Libertadores ou Copa do Brasil. Não vou incluir o Campeonato Rural nesta lista porque as suas reais regras não são escritas. Agora até o ET de Varginha descobriu como funciona. Como diz o Marcelo Barreto, do Sportv: “O futebol brasileiro está trabalhando para tirar o sofá da sala”. Uma pena.

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