Fred Melo Paiva

DA ARQUIBANCADA

Foi como o pênalti de Riascos. Foi lindo demais

O Mineirão, palco preferencial da nossa desgraça, virou de uma hora pra outra um amuleto da sorte

postado em 18/10/2014 12:00

Fred Melo Paiva /Estado de Minas

JUAREZ RODRIGUES/EM/D.A PRESS
Não fui ao jogo contra o Corinthians e não me arrependo. Cético das coisas de Deus, devoto exclusivo de São Victor, sou um crente da Teoria do Caos e do Efeito Borboleta. Se um inseto que bate a asa lá no Nepal pode acabar provocando um tufão na Califórnia, meu deslocamento até o estádio certamente tinha potencial pra mudar o regime dos ventos e o resultado do jogo. Ainda bem que eu não fui. Porque nada, absolutamente nada, poderia ter sido diferente naquela noite mágica de quarta-feira.

Entre 1977 e 2013, o atleticano comeu o pão que o diabo amassou. Eu tenho impressão de que Deus, no caso de existir, de repente olhou lá de cima e disse: “Quem é esse pessoal que a gente esqueceu aqui nesse canto?”. A que um de seus assessores, São Pedro ou São Paulo, respondeu: “Uai, são os atleticanos! Estão nesse limbo desde 1971, quando o Telê prometeu caminhar até Congonhas e pegou um táxi”.

O sósia de Karl Marx deu-se conta então do ocorrido: “Mas, rapaz, não era pra tanto...”. Diante do equívoco, fomos libertados em julho do ano passado. E desde então, apesar de alguns pesares, a justiça divina nos devolve com juros e correção o sofrimento do passado.

O pagamento da fatura não vem apenas com títulos, que, como bem sabemos, são preferências de cartórios e simpatizantes que trocariam tudo pela sorte de gritar Galo ao primeiro sinal de um copo quebrado na cozinha. “Não basta ganhar”, matou a charada minha amiga Elen Campos Munaier. “Tem de fazer história.”

O que o Galo faz desde 30 de maio de 2013, o Dia de São Victor do Horto, é História com H maiúsculo. Ganhamos a mais bela Libertadores de todas. Choramos abraçados aos nossos algozes no Marrocos, em um congraçamento mágico que “apenas” os 20 mil que lá estiveram são capazes de entender. Levantamos uma Recopa “num jogo que tem tudo para ser cultuado por gerações e gerações de torcedores”, nas palavras do acossador de candidatos Willian Bonner no Jornal Nacional.

O Mineirão, palco preferencial da nossa desgraça, virou de uma hora pra outra um amuleto da sorte. Que coisa! Começou ali, se Deus quiser, a derrocada épica do Cruzeiro diante de um Galo terrorista, atacando de Carlos, o Chacal. Mas se aquilo lhe pareceu um momento especial, ficou pequeno perto do que se deu por lá na quarta-feira.

Foi como o pênalti de Riascos. Foi lindo demais. Gritei sozinho, na solidão da minha sala, esse grito de “Eu acredito” que me arrepia até o pelo do nariz. Foi no dia que nasceu minha sobrinha, Helena – que se fosse minha filha se chamaria Edcarla. Entre o quarto gol e o apito final, me fechei no quarto com um dedo em cada ouvido, certo de que é assim que se enfarta. Mas o revés, meu amigo, não nos acontece mais: é muito juro, é muita correção.

Ao fim, veio a Dancinha do Mano abrilhantar nosso salão de festas. Já testei e recomendo: pode-se dançá-la no ritmo de um reggaezinho malemolente. Ou antes do banho matinal, peladão, no lugar do alongamento ou do yoga. Funciona.

Obrigado, Tardelli, Guilherme, Luan, Edcarlos. Obrigado, Levir e o time todo. Obrigado, Mano. Obrigado pelo capítulo épico na mais bonita história de amor e superação do esporte mundial. E digo aos descrentes do Brasileirão: enquanto houver Dedé, há esperança.

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