Fred Melo Paiva

DA ARQUIBANCADA

Se fosse música, o Galo seria um tango argentino

"Fico imaginando o que se passa no vestiário durante o intervalo. 'Estamos bem no jogo, pessoal, mas vocês já sabem que agora é a hora da maldade'"

postado em 01/10/2016 12:00 / atualizado em 01/10/2016 11:50

Bruno Cantini/Atlético


Minha caixa de entrada está repleta de e-mails urgentes, que se acumulam como contas a pagar. Meus exames médicos estão defasados, a limpeza no dentista, o cabelo pra cortar. Estou devendo um post contra o Trump e outro contra o Dória. Estou inadimplente com meu filho nas batalhas de Pokémon. Não vi Aquarius. Não vi Narcos. Faltei no pilates e na vida. Aos que deixei esperando, aos que enrolei, desprezei, esqueci, protelei, já vou logo avisando: hoje eu não posso, tem jogo do Galo!

Que se dane todo o resto! Se Temer e os 40 ladrões têm uma Ponte para o Futuro, nós também temos uma – a Ponte Preta. Não será nada fácil atravessá-la, mas vamo que vamo igual ao Indiana Jones lutando com o inimigo em cima daquelas pontes de madeira caindo aos pedaços, o abismo sob os seus pés. É assim que a gente gosta: com bastante emoção, com bastante sofrimento! Se fosse música, meus amigos, o Galo seria um tango argentino, um blues, um samba do Cartola. Qualquer uma do Nélson Gonçalves.

Ser feliz é fácil, tá cheio de receita pra isso, do livro de autoajuda ao PIB da felicidade que o Butão (o país) adotou. Quero ver é fazer sofrer, aí é que são elas! É preciso técnica apurada para alcançar esse objetivo. De olho na demanda de seu público, o Atlético adotou uma estratégia que vem dando certo: ganha o jogo no primeiro tempo, entrega no segundo. Perfeito.

Fico imaginando o que se passa no vestiário durante o intervalo. “Estamos bem no jogo, pessoal, mas vocês já sabem que agora é a hora da maldade, a hora de fazer o atleticano sofrer, não me decepcionem”, diz Marcelo Oliveira em seu discurso desmotivacional, antes de exibir um vídeo do Hardy, aquele personagem da Hanna Barbera: “Ó, vida, ó, céus, ó, azar, isso não vai dar certo...”. Bingo!

Aí, voltamos pro campo igual contra o Juventude: naquela disposição de entregar a rapadura, aquela vontade de perder cada bola, aquele desejo incontrolável de recuar sempre pro Victor. E o cartãozinho vermelho pro Carlos César? Que beleza, né não? Se não fosse por isso, que garantia teríamos com relação ao nosso sagrado direito de sofrer? Eu mesmo ligaria no SAC do GNV e invocaria as letras miúdas do contrato: “Tá escrito aqui que se não for sofrido não é Galo, exijo meu dinheiro de volta, esse Atlético é do Paraguai”.

Outro dia, vi uma tabela do campeonato com as pontuações apenas dos primeiros tempos dos jogos. Tamo disparado na frente! Mas que graça teria isso? Quer passar a vida sem sofrer, é só ficar jogando campeonato metropolitano com o Crüzeiro, aquele time que avacalhou a gente na final da Copa do Brasil facilitando a nossa vida. Todo mundo esperando o título épico, e os caras não fazem nenhum golzinho, nada, nem um penaltizinho roubado, parecia um time de profissionais jogando contra os casados da firma.

Uma vez, o eterno presida me disse o seguinte acerca do sofrimento do atleticano: “Quem nunca levou um pé na bunda é um bobo”. Tá certíssimo o Turco, que não é turco! Quem não vai ao fundo não merece o topo, porque não irá valorizá-lo a contento. Eu me fio é nisso vendo a pelada se instalar a cada segunda etapa. Senão, o que fazer? É como disse um gaiato na internet: “Se houver uma camisa branca e preta pendurada no varal durante uma tempestade, o atleticano torce contra o intervalo”.

Hoje tem Ponte, na quarta tem Corinthians, nas quartas o Juventude – tudo fora de casa. Além disso, temos a missão de secar o Crüzeiro, o que dá um calo no olho, que nem o Dr. Scholl da oftalmologia é capaz de curar. Atleticanos de todo o mundo, uni-vos na sofrência! Seremos campeões.

Tags: atleticomg