TIRO LIVRE

Um enredo especial

O campeão também pintou quando, a cada tropeço cruzeirense, seus concorrentes igualmente vacilaram

postado em 21/11/2014 08:00 / atualizado em 21/11/2014 11:29

Kelen Cristina /Superesportes

Jefferson Bernardes / Light Press


A quinta-feira estava chegando ao fim. O relógio marcava 23h45 quando o árbitro pediu a bola e determinou o fim do jogo entre Cruzeiro e Grêmio, em Porto Alegre, com a vitória celeste de virada, por 2 a 1. O apito final do paulista Vinícius Furlan foi a senha para que a comemoração cruzeirense começasse. No estádio gremista, ela até foi tímida – extenuados pelo esforço feito para garantir o triunfo no Sul, alguns jogadores da Raposa se sentaram no campo, entregues ao cansaço. Mal tinham forças para caminhar para vestiário, o que dirá para festejar. Quem estava no banco de reserva, no entanto, se soltou mais, com abraços e sorrisos. Em BH, o som das buzinas invadiu o silêncio da madrugada. Pintou o campeão.

Pintou o campeão? Sim, mas não ontem, não agora. O campeão pintou quando, em janeiro, a diretoria do Cruzeiro manteve, para a temporada’2014, praticamente todo o grupo que levantou a taça do Brasileiro de 2013 – a começar pelo técnico Marcelo Oliveira, responsável direto pela correção de rumo da Raposa.

Talvez o campeão tenha pintado um pouco depois, em maio, quando o time celeste derrotou o Sport por 2 a 0, no Mineirão, pela sexta rodada, e assumiu a liderança, da qual não saiu mais. Era a partida de despedida do Gigante da Pampulha, que seria, então, liberado para a Copa do Mundo.

O campeão também pintou quando, a cada tropeço cruzeirense, seus concorrentes igualmente vacilaram. O Internacional e o São Paulo até ensaiaram fazer sombra à equipe mineira, mas falharam quando tiveram chance de se mostrar uma ameaça real. Ao longo do campeonato, a dupla não passou de adversários imaginários para os celestes. Era só eles fungarem no cangote da Raposa para o time de Marcelo Oliveira reagir e abrir nova vantagem. Nesse jogo de gato e rato, o felino nunca alcançou sua presa. Por fim, cansado de tanta perseguição em vão, entregou os pontos.

O campeão já havia pintado há muito tempo justamente por isso: quando foi pressionado na luta pelo tetra, o Cruzeiro soube se superar. Mostrou sua força e poder de definição. Há pelo menos seis meses já estava evidente que a Raposa tinha uma das mãos na taça. Conduzi-la para sua galeria era questão de tempo. Agora, são três dias. O destino não poderia ter preparado roteiro melhor: se no ano passado, a conquista foi festejada na Bahia, desta vez com script corrigido, a volta olímpica pode ser em casa. Diante da torcida e no palco que foi determinante para a caminhada.

São 30 rodadas na ponta, um inquestionável aproveitamento de quase 70%, com o melhor ataque da competição – 62 gols marcados, média de 1,77 por partida. Números que avalizam uma campanha que não deveria ter sido questionada, mas foi. Nos últimos confrontos pelo Brasileiro, especialmente, a Raposa foi desafiada. Criticada pela queda de rendimento. As vitórias sobre Criciúma, Santos e Grêmio foram garantidas no segundo tempo. Qual a novidade? Dos 62 gols marcados pela equipe, nada menos que 38 saíram na etapa final.

Quem enxerga o copo meio vazio diz que o time celeste não é mais o mesmo. Mas quem vê o copo meio cheio avalia por outro ótica. A esta altura do campeonato, com todo o desgaste provocado pela maratona de partidas, com o réveillon quase batendo à porta, o Cruzeiro ainda reúne forças e consegue reviravoltas que muitos não imaginariam.

Ontem foi mais um exemplo. Primeiro tempo morno, o time parecia travado. Mas aí veio a bronca de Marcelo no vestiário, os gols e a virada. Ricardo Goulart (foto) empata e reacende a esperança. Dez minutos se passam, e Éverton Ribeiro consolida o triunfo. Dois dos principais protagonistas da vitoriosa jornada são, mais uma vez, fundamentais.

Diante de tantos ingredientes, fica a pergunta: quem sabe não é estratégia? A Raposa finge estar abatida para enganar seus adversários e, nos 45 minutos finais dos jogos, quando o oponente dá a batalha por resolvida, ressurge das cinzas. A história fica mais dramática, é verdade. Mas enredos assim costumam ser muito mais especiais.

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