TIRO LIVRE

Calejado pelas lições do futebol

Não é de estranhar a reação (bem realista por sinal) de Levir ao ser questionado sobre o momento do Galo neste início de Brasileiro

postado em 22/05/2015 12:12 / atualizado em 22/05/2015 12:17

BRUNO CANTINI / ATLÉTICO
"Bom mesmo é o Barcelona, o Real Madrid", disse o técnico atleticano Levir Culpi (foto), quando começaram a surgir analistas apontando o Galo como candidato ao título brasileiro, depois de disputadas só duas rodadas do Nacional. Bem ao seu estilo, mezzo irônico, mezzo ranzinza, o treinador passou o recado. Até porque Levir sabe muito bem: se amanhã, no mês que vem ou no fim do ano a receita desanda e as previsões são se confirmam, o primeiro a pagar a conta será o próprio.

O Atlético vem atuando bem, isso é uma questão. Outra é fazer uma projeção para mais 36 rodadas baseando-se em apenas duas, sendo que há muitas variantes no caminho até a conclusão da equação. E aí não entram somente questões técnicas, de escolhas do treinador baseadas no desempenho dos jogadores. Há uma janela de transferência para a Europa no meio do ano que fisga os principais destaques; o risco de contusões, além das possíveis ameaças de dificuldades financeiras que afligem os times brasileiros – e a falta de dinheiro pode abrir espaço para que a teoria Vampeta entre em campo: “Eles fingem que pagam e eu finjo que jogo”.

E registre-se ainda que o Galo não está esta Brastemp toda. A goleada por 4 a 1 sobre o Fluminense, em Brasília, no domingo, foi incontestável. O alvinegro teve uma sintonia que há muito não mostrava. Foi uma equipe mais compacta, o goleiro Victor pouco sujou o uniforme, e o ataque funcionou. Mas foi apenas um jogo, e assim deve ser a análise, até que haja regularidade, consistência e padrão que justifiquem qualquer avaliação muito otimista.

O futebol é um esporte dos mais imprevisíveis. Administrar todos os fatores intra e extracampo é uma arte que poucos técnicos conseguem, especialmente numa competição de longo prazo. O Atlético tem um grupo equilibrado, mas bem operário. Como não há time voando baixo em gramados brasileiros, é natural que seja incluído numa lista de candidatos em potencial. Contudo, no mesmo nível estão pelo menos outras cinco equipes, e no cenário atual é muito incerto cravar, desde já, quem vai ter gás para chegar e levantar a taça em dezembro.

Do alto dos seus 62 anos, Levir Culpi já viveu de tudo um pouco nos campos. Aliás, não precisa ir muito longe: no próprio Galo ele foi do céu ao inferno e do inferno ao céu, sem passagens pelo purgatório. E aprendeu as lições. Em 2004,em outro Atlético, o excesso de confiança custou a ele uma contundente rasteira do destino. Restavam cinco jogos para o fim do Brasileiro e Levir comandava o líder do campeonato, o Atlético-PR, que contava com um time afinadinho – tinha como destaques os jovens Fernandinho e Jádson e um ataque com os ascendentes Dagoberto e Washington. Acreditando na capacidade de seus atletas, o treinador soltou a frase que entrou para o folclore do futebol: “Agora entramos no piloto automático”. Pois errou, e feio. O Santos, dos meninos da Vila, aproveitou-se de tropeços fatais do Furacão e, no fim das contas, levou o troféu.

Levir não admite a infelicidade da afirmação. Disse ter sido mal-interpretado. Segundo ele, ao citar o “piloto automático” ele quis dizer que a equipe precisava “manter a trajetória regular”. Mas que pegou mal, pegou. E sempre que ele retorna a Curitiba para enfrentar o rubro-negro é lembrado disso. Aquele vice-campeonato não desceu bem para dirigentes e torcedores do Atlético-PR.

Por isso, não é de estranhar a reação de Levir (bem realista, por sinal) ao ser questionado sobre o momento do Galo neste início de Brasileiro. O caminho está certo, mas é longo e haverá obstáculos, encruzilhadas, armadilhas. Não custa esperar um pouco mais para apontar um time encorpado o suficiente para ser considerado virtual campeão. Até porque, essa competição de adivinhação não garante premiação alguma ao acertador.

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