Atlético

ENTREVISTA/DANIEL NEPOMUCENO

'O Galo é infinitamente superior à Seleção'

Dirigente cobra urgência no acordo com a Receita sobre a dívida fiscal do clube

postado em 20/06/2015 08:15

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press


Aos 36 anos, o advogado e vereador Daniel Nepomuceno ocupa há seis meses a cadeira de presidente do Atlético. E sente a dificuldade de dirigir um grande clube no Brasil. Embora com a dívida fiscal de R$ 240 milhões planejada e negociada, nada vigora ainda e os juros contam dia pós dia. Com a Justiça Federal, está tudo acertado, num Refis de 240 meses, que custará aos cofres do Galo R$ 1 milhão mensal, porém, segundo o dirigente, a Justiça mineira está travando o processo, que atrasa a assinatura do contrato. Ainda há chance de o alvinegro entrar na negociação coletiva dos clubes, mas desde que a medida provisória do governo seja alterada.

O Atlético está há sete meses com a dívida fiscal equacionada com a Receita Federal. O que impede a negociação de ser concretizada?

O ex-presidente Alexandre Kalil negociou tudo e deixou tudo acertado, mas nada foi assinado até agora. A Justiça mineira está travando, alegando que teríamos de passar por ela. Fizemos tudo dentro da lei, conseguimos o Refis na gestão de Kalil, um homem que ajeitou o clube e deu a ele títulos, mas há esse entrave. Estamos pagando juros sobre juros, pois R$ 240 milhões é uma boa fortuna. Espero que consigamos resolver a questão o mais rapidamente possível, para poder tocar o clube como desejamos.

A medida provisória do governo não atende ao clube?

A nenhum clube. Se for aprovada nos moldes que o governo quer, será um suicídio para os clubes brasileiros. A Lei Pelé só afundou as instituições esportivas, e, se essa medida passar, não há como os clubes pagarem as dívidas fiscais, pois cada um sabe o tamanho da sua dívida e de que forma pode pagá-la. O Atlético tem interesse caso haja mudança no texto. Os clubes têm de ser ouvidos, são os maiores interessados. Só o Flamengo foi a favor da medida provisória do governo, pois tem patrocínio de R$ 30 milhões da Caixa e pagaria a dívida com o próprio dinheiro recebido do governo. Dinheiro do povo.

O Independência é rentável para o Galo? Por que o time quase não joga no Mineirão?

A única saída para os grandes clubes é a construção de estádio próprio. Estou pensando em ampliar o Independência, mas, ainda assim, ele é pequeno para a torcida do Galo. Pensamos em construir um estádio no Bairro Califórnia, onde já ganhamos o terreno da MRV, mas é uma obra de R$ 500 milhões. O Mineirão comporta o triplo dos torcedores do Independência, mas as taxas são inviáveis. Se o Estado quiser dar o Mineirão para Atlético e Cruzeiro, com toda a arrecadação dos ingressos para a gente, aí seria bom negócio e eu desistiria de construir um estádio. Porém, do jeito atual, sem a menor chance. E o Independência foi fundamental para a conquista da Libertadores. Transformamos o estádio num caldeirão e nele vencemos jogos considerados impossíveis.

Não há ninguém disposto a fazer o estádio para o Galo?


Há sim, mas nos moldes de Corinthians e Palmeiras não queremos. Só aceito que uma empresa faça se tivermos as 45 ou 50 mil cadeiras. Caso contrário, entraremos numa fria, pois não vou dar estádio para que a empresa construtora lucre. E com recursos próprios não temos condições de fazê-lo. Com a receita de bilheteria, consigo pagar a folha mensal, e aí as outras receitas serão usadas para contratações e outros investimentos. Com isso concretizado, o Atlético não deverá nada a um Real Madrid da vida.

Uma dívida de R$ 240 milhões equacionada, mas não resolvida, deixa algumas contas em atraso?

Não é fácil. Agora mesmo, estamos com dois meses de direitos de imagem atrasados, por conta de um bloqueio na Justiça mineira, justamente porque a negociação em Brasília não está liberada. Tenho dinheiro em outra conta, mas não vou perder juros, e disse isso aos jogadores, que entenderam bem. É preciso que olhem o Atlético com mais carinho.

Porque a Caixa Econômica Federal não patrocina o Atlético?

É mais um dos absurdos que a gente vê neste país. A Caixa patrocina 12 clubes, entre eles alguns com peso bem inferior ao do Atlético. O dinheiro é do povo, acho um absurdo essa discriminação. Dinheiro público não é para patrocinar ninguém, mas, já que se patrocina 12 clubes, por que o Atlético ficou de fora?

Qual a despesa anual do clube?


Cerca de R$ 150 milhões. Confesso que não é fácil manter um grupo como o que temos no atual momento da economia. Rio e São Paulo têm privilégios mil, e tudo para nós aqui é difícil. Tenho de manter um time competitivo, pois essa é a nossa prioridade, ganhar títulos, com receitas bem inferiores a times de Rio e São Paulo. Não é fácil.

E as propostas da Europa por Marcos Rocha e Luan?

Não pretendo vender ninguém, queremos ganhar o bi da Copa do Brasil e o Brasileiro, que não ganhamos há mais de 40 anos. Minha prioridade são os títulos e disso não abro mão. O presidente Kalil transformou o Atlético em um time vencedor e fiz parte da gestão dele. Esse é o meu compromisso maior com a torcida. Agora, se chega uma proposta irrecusável para o clube e para o jogador, é impossível segurá-lo, pois o euro vale quase quatro vezes o Real. Meu objetivo é manter o grupo atual, que acho forte e em condições de ganhar os títulos que disputar.

O senhor tem investido nas divisões de base?

Claro que sim. É uma das minhas prioridades, pois a base sempre foi um celeiro de craques. Recentemente, cedemos o Rogério Micale para a Seleção e só não liberamos o diretor da base porque entendemos a importância dele aqui. O Atlético tem formado muitos bons jogadores. Quem paga escola pública privada, dá moradia e 3 mil alimentações por mês são os clubes, mas o governo parece que os marginaliza. Os jogadores formados na base devem dar lucro de pelo menos 60% aos clubes. É inadmissível formarmos e não termos direito a nada.

Não acha que a unificação do calendário brasileiro ao europeu seria uma solução?

Claro. É a única solução para não perdermos nossos principais jogadores no meio do ano. Isso vai acontecer mais cedo ou mais tarde, e a CBF já nos deu carta branca para trabalharmos o que for melhor para os clubes.

Como torcedor, acha que Leandro Donizete tem lugar no time?

Acho, mas escalação é com o Levir Culpi. Mas todos os torcedores sabem da importância do Donizete para o Atlético.

Há torcedores pedindo a saída do Levir e a volta do Cuca. O que acha disso?

Levir é um cara espetacular, confio muito nele. Não acho correto ficar trocando de técnico, isso não deu certo em clube nenhum. Nunca vi um clube ser campeão com três técnicos em um ano. Mas é claro que, se os resultados não vierem, será preciso mexer, pois o Atlético, como eu disse, é um clube acostumado a ganhar taças, e disso não abro mão.

E o Diamond Mall, como estão as receitas do shopping para o Atlético?

Bem abaixo do que desejamos. Vou-me reunir com a Multiplan e negociar algo melhor para o clube. Prefiro não falar em valores, mas vamos buscar mais recursos. Eles ainda têm 11 anos de exploração do Diamond. Qualquer contrato de uma grande cadeia tem de ser renovado de cinco em cinco anos. É claro que não está na cabeça da Multiplan negociar conosco, pois tem medo de a tirarmos. Não quero entrar em polêmica. Parceiro do Atlético tem de estar em sintonia com o clube. Nosso objetivo é reforçar o time e construir o estádio. O recado está dado.

O que achou da prisão de José Maria Marin? É a favor da renúncia de Marco Polo del Nero na CBF?


Achei lamentável, mas quem erra tem de pagar pelo erro. Já o Marco Polo, em reunião conosco esta semana, disse que entregou todos os contratos ao Ministério Público e está tranquilo. Então, até que se prove o contrário, é inocente. E deu aos clubes toda a autonomia.

É difícil ser presidente do Atlético?

Muito. Você é apaixonado pelo clube e sofre muito. Sinto-me responsável pelas derrotas e, quando elas acontecem, como para o Inter, sabendo que a gente estava melhor e fomos eliminados, magoam muito. Agora digo: o Atlético é melhor do que a Seleção Brasileira. Ponha o Neymar no Galo e vamos ganhar tudo. Nosso grupo é infinitamente superior ao da Seleção. Pegue os últimos 10 jogos e compare.

PERFIL E FRASES

36 anos, advogado, vereador e presidente do Atlético

“Se o Estado quiser dar o Mineirão para Atlético e Cruzeiro, com toda a arrecadação dos ingressos para a gente, aí seria bom negócio e eu desistiria de construir um estádio. Porém, do jeito atual, sem a menor chance”

“Só aceito que uma empresa faça se tivermos as 45 ou 50 mil cadeiras. Caso contrário, entraremos numa fria, pois não vou dar estádio para que a empresa construtora lucre”

“Agora mesmo, estamos com dois meses de direitos de imagem atrasados, por conta de um bloqueio na Justiça mineira, justamente porque a negociação em Brasília não está liberada”

“Minha prioridade são os títulos e disso não abro mão. Agora, se chega uma proposta irrecusável para o clube e para o jogador, é impossível segurá-lo, pois o euro vale quase quatro vezes o Real”

“Sinto-me responsável pelas derrotas e, quando elas acontecem, como para o Inter, sabendo que a gente estava melhor e fomos eliminados, magoam muito”

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