Copa América

COPA AMÉRICA

Escotilla n° 8: setor do estádio palco da final da Copa América relembra tempos de ditadura

Local foi preservado e continua igual ao ano da sua inauguração, em 1937

postado em 03/07/2015 20:10 / atualizado em 03/07/2015 20:12

Pedro Galindo /Especial para o Diario

Conmebol/Divulgação
Neste sábado, o clima no Estádio Nacional de Santiago será de absoluta euforia. Assim como tem sido ao longo de toda a Copa América. Diante da Argentina de Lionel Messi e outros grandes talentos, a seleção chilena fará a final do torneio e terá a oportunidade de conquistar o maior título de sua história em casa, diante de sua torcida que provavelmente lotará as arquibancadas. Exceto por um pequeno setor chamado Salida nº 8.

Nesse espaço ínfimo em relação à capacidade total do estádio, o visual é bem diferente. Ao invés dos assentos vermelhos que predominam no estádio, a mesma bancada de madeira colocada na inauguração, em 1937. Entre a cancha e as arquibancadas, ao invés de acrílico, grades altas, com extremidades pontiagudas no topo. Um pedacinho de passado preservado para que ninguém se esqueça dos horrores que o Estádio Nacional abrigou nos meses finais de 1973.

Em 11 de setembro daquele ano, Salvador Allende, presidente eleito, sofreu um golpe encabeçado pelas Forças Armadas e liderado pelo General Augusto Pinochet. Com o país em estado de sítio, o novo governo tinha total respaldo para realizar prisões em massa. E para abrigar os milhares de prisioneiros políticos capturados então, o Estádio Nacional deixou de ser somente casa da seleção 'Roja' para se tornar também campo de concentração.

Memória viva
Entre essas vítimas, estava Manuel Méndez. Às vésperas de completar 25 anos, o jovem era operário numa fábrica de vidros e espelhos. Não chegou a ir a qualquer manifestação contra ou a favor a ditadura, mas no dia seguinte ao golpe, foi preso junto a alguns colegas mais engajados, quando as tropas invadiram a planta onde ele trabalhava. Por cerca de três meses, dividiu com outros 300 presos o vestiário de cerca de 50 m² em que comemorou seu aniversário.

Lá, Manuel e vários deles foram sofreram tortura. Mais de mil mulheres (algumas, grávidas) foram presas e submetidas a maus tratos e abusos, inclusive sexuais. Ainda tiveram mais sorte do que outros milhares como o poeta Victor Jara, assassinado com 44 tiros pelos militares. No total, mais de 20 mil cidadãos conheceram a prisão que foi o Estádio Nacional durante aqueles meses. E é em nome deles que a Salida nº 8 é mantida exatamente como era naquele período. “É um castigo para o Chile e para o futebol chileno, por uma mancha negra na nossa história”, conclui Méndez.