Mais Esportes

ESPECIAL: MÁ GESTÃO DAS CONFEDERAÇÕES

Principais prejudicados dos problemas com a gestão do esporte brasileiro são os atletas

Embora sejam protagonistas, historicamente são tratados como fantoches

postado em 27/06/2016 19:54 / atualizado em 03/07/2016 20:55

Maíra Nunes

Wander Roberto/CBB (2006)
Após escutar 1.196 atletas e ex-atletas olímpicos, além de estudar a história de 321 competidores já mortos, a pesquisadora Kátia Rúbio conta que os prejuízos da má gestão das confederações esportivas do país ficam evidentes nos relatos dados pelos esportistas brasileiros. A dificuldade enfrentada por aqueles que já disputaram uma Olimpíada para conseguirem participar pela segunda ou terceira vez de um dos principais eventos esportivos mundiais é demonstração disso. “São profissionais talentosos e competentes, ou não teriam conseguido se classificar na primeira vez. Mesmo eles esbarram em obstáculos para seguir no esporte”, observa a pesquisadora.

“O que a gente percebeu é que o ciclo olímpico se resume aos seis meses a um ano que antecedem os Jogos”, aponta a coordenadora do Grupo de Estudos Olímpicos da Escola de Educação Física e Esporte da USP. Dentre tantas histórias, a do velejador Lars Grael foi a que a pesquisadora usou para exemplificar a situação enfrentada pelos atletas brasileiros. O velejador contou à ela que apareceu um empresário oferecendo um barco e todas as condições para ele disputar as Olimpíadas faltando um ano para a competição. “Olha que ele já era um medalhista olímpico”, ressalta Kátia Rúbio, sobre o dono de dois bronzes olímpicos na vela. 

A ex-jogadora Janeth, uma das estrelas do basquete brasileiro, também relatou sufoco na carreira, mesmo depois de provar o talento dela em quadra. Após conquistar uma medalha olímpica junto da Seleção, ela conta que voltou ao Brasil preocupada se o time em que atuava no país continuaria existindo. Problemas como estes, apesar de pontuais, se repetem nos relatos dos esportistas e mostram que existe relação com as confederações que regem as modalidades. 

“O atleta faz parte de um emaranhado de organizações esportivas. Ele não consegue nem participar de uma competição local se não estiver atrelado a uma federação”, aponta a pesquisadora. “Então, não adianta ter um atleta talentoso se não há estrutura e condições para ele se desenvolver”, conclui. 

Também cabe às federações esportivas a intermediação de incentivos financeiros do governo e a aplicação deles na modalidade e nos atletas. “Como o aporte financeiro da iniciativa privada no Brasil ainda é muito tímido em relação a outros países, resta aos atletas a dependência financeira junto às entidades federativas do esporte”, observa Eduardo Ambrósio, diretor executivo da Send Sports, empresa criadora do projeto de pesquisa Gestão no Esporte em Vitória, ES. 

A má gestão dos recursos públicos destinados ao esporte prejudica principalmente o atleta. “Ele é o protagonista desse espetáculo, mas historicamente é tratado apenas como um fantoche no sistema”, avalia a pesquisadora Kátia Rubio. Tentativas como a do Bom Senso FC, no futebol, e do Atletas pelo Brasil tentam construir uma maior consciência de classe. 

“Os atletas estão nas mãos das entidades e sentem receio de ficar fora das principais competições”, explica a professora da USP. O mais complicado, segundo ela, é o fato de ser o esportista quem paga o preço sozinho por uma performance longe dos pódios. "A aquisição e manutenção de patrocínios e de incentivos do governo são baseadas em resultados, mas, para o público nacional, a cobrança por desempenho recai quase que exclusivamente sobre os atletas, sem se atentar às condições que foram enfrentadas por eles no processo de desenvolvimento e preparação antes das competições", completa.