Futebol Internacional

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Menos de 1% dos técnicos de seleções no mundo é brasileiro

Número explica - em parte - a dificuldade que o país tem em encontrar um treinador à altura das suas tradições. Falta de formação e excesso de ex-jogadores no cargo são alguns dos fatores da baixa procura

Apenas duas seleções entre as 209 associadas à Federação Internacional de Futebol (Fifa) são treinadas por brasileiros. Uma é o Brasil, de Dunga. A outra é o Kuwait, de Jorvan Vieira, que, apesar de ter nascido em Duque de Caxias (RJ), é inscrito na federação como português. O índice — abaixo de 1% no universo global — ilustra bem a fase dos técnicos nacionais, que chegaram a ser quatro no comando de equipes estrangeiras na Copa do Mundo de 2006.

AFP PHOTO / ALEXANDER JOE


Mesmo desconsiderando o quadro oficial, que coloca Jorvan como patrício, o Brasil, comandando selecionados estrangeiros, se iguala a nações de menor expressão no cenário internacional, quando o assunto é futebol: Argélia, Bahrein, Canadá, Hong Kong e Peru, por exemplo. O claro declínio se reflete na própria Seleção Brasileira. Após a demissão de Luiz Felipe Scolari, que deixou o comando depois do fiasco na Copa de 2014, ressurgiu a possibilidade de um estrangeiro assumir, pela primeira vez, o comando da equipe pentacampeã. Se isso tivesse ocorrido, apenas Jorvan Vieira seria o “brasileiro” à frente de uma das 209 seleções do mundo.

“O calendário apertado do futebol brasileiro e a saída precoce de jogadores impede um trabalho contínuo, de qualidade e que seja reconhecido fora do país”, acredita o técnico Marcos Paquetá quando enumera os motivos da baixa procura. Atualmente treinador do Al-Gharafa, do Catar, Paquetá comandou a Arábia Saudita na Copa de 2006 e a Líbia na Copa Africana de Nações de 2012.

Outro motivo apontado pelo treinador é a busca das federações por perfis mais parecidos aos dos campeões mundiais. “Agora, você tem em voga o estilo mais rápido, dinâmico e participativo de técnicos alemães e espanhóis. A escolha dos treinadores depende muito de cada safra”, justifica.

No total, 73 seleções do mundo — ou aproximadamente um terço — são treinadas por técnicos de outros países. Apesar do sucesso de Espanha (2010) e Alemanha (2014), atualmente, quem mais exporta treinadores é a França, com 12 treinadores, quase todos em nações que falam francês — uma clara mostra que a língua também é um obstáculo para os técnicos brasileiros. A Alemanha é a vice-líder, com sete treinadores — eram oito até 1º de julho, quando Ottmar Hitzfeld deixou a equipe da Suíça. Os vizinhos Argentina e Colômbia têm três comandantes cada.

Entre os países da América do Sul, o Brasil está atrás na exportação de técnicos também entre clubes. Não há brasileiros no comando das principais equipes europeias. Já treinadores de Argentina e Chile tiveram boa temporada na Europa, com Diego Simeone à frente do campeão espanhol Atlético de Madrid e Manuel Pellegrini, campeão inglês com o Manchester City.

Formação
Para o coordenador do curso de treinadores do Instituto Brasileiro de Gestão e Marketing (IBGM), Edvaldo Tacão, a falta de nomes brasileiros à frente de equipes internacionais se deve à má qualificação de técnicos. “Investe-se na formação de atletas, mas não em professores. É preciso ensinar profissionais a entender detalhes técnicos do esporte”, argumenta.

O caminho mais usual para se chegar ao comando de um time no Brasil é o de ex-atleta, que segue em campo na parte técnica. Dos 20 treinadores da Série A do Campeonato Brasileiro, por exemplo, 12 são ex-jogadores profissionais. “A vivência é importante para entender melhor o atleta, mas o conhecimento tático é um diferencial”, defende Tacão.

Cursos de educação física e de pós-graduação em gestão esportiva são os mais procurados por quem deseja seguir a carreira de treinador no Brasil. Há ainda cursos não acadêmicos para técnicos, oferecidos por instituições diversas, inclusive a própria Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Na América do Sul, a Argentina se destaca por revelar mais treinadores de sucesso. Na Copa de 2014, Jorge Sampaoli levou o Chile às oitavas de final, José Pekerman conduziu a Colômbia às quartas, e Alejandro Sabella foi vice-campeão com a seleção do país. Eles têm formação no curso da Associação de Técnicos do Futebol Argentino (ATFA), exigida, desde a década de 1990, para assumir equipes da primeira e segunda divisões. “Em 1989, a Associação do Futebol Argentino (AFA) nos transferiu esta responsabilidade de formar treinadores. Atualmente, são 12 mil afiliados”, explica o diretor de escolas da ATFA, Abel da Graça, sobre o processo de formação na Argentina.

Ranking

A nacionalidade de cada um, entre os 73 treinadores que comandam equipes estrangeiras


1º França - 12
2º Alemanha - 7
3º Espanha e Holanda - 5
4º Itália e Sérvia - 4
5º Argentina e Colômbia - 3
6º Áustria, Bélgica, Egito,
Irlanda do Norte, Japão,
Polônia, Portugal,
Suécia e Suíça - 2
7º Argélia, Bahrein, Brasil,
Canadá, Coreia do Sul,
Costa Rica, Estados Unidos,
Hong Kong, Índia, Peru, Uruguai - 1

Em copas

Técnicos brasileiros em seleções do exterior nos mundiais


1966 – Otto Glória (Portugal): 3º lugar
1970 – Didi (Peru): 7º lugar
1982 – Tim (Peru): 20º lugar
1982 – Carlos Alberto Parreira (Kuwait): 21º lugar
1986 – José Faria (Marrocos): 11º lugar
1986 – Evaristo de Macedo (Iraque): 23º lugar
1990 – Carlos Alberto Parreira (Emirados Árabes): 24º lugar
1998 – Carlos Alberto Parreira (Arábia Saudita): 28º lugar*
1998 – Renê Simões (Jamaica): 22º lugar
1998 – Paulo César Carpegiani (Paraguai): 14º lugar
2002 – Alexandre Guimarães (Costa Rica): 19º lugar
2006 – Alexandre Guimarães (Costa Rica): 31º lugar
2006 – Zico (Japão): 29º lugar
2006 – Luiz Felipe Scolari (Portugal): 4º lugar
2006 – Marcos Paquetá (Arábia Saudita): 28º lugar
2010 – Carlos Alberto Parreira (África do Sul): 20º lugar

* Parreira ainda foi demitido no meio da Copa do Mundo, logo após o segundo dos três jogos que fez a Arábia Saudita.